Ter o produto certo, na hora certa e com a melhor relação custo-benefício é o grande desafio do varejo. Uma extensa cadeia de valor é movimentada para viabilizar esse objetivo; e não comercializar um produto pela sua falta de abastecimento e exposição torna todo esse esforço em vão, gerando efeitos negativos para o cliente e para a gestão de fluxo de caixa do varejista.
Esses efeitos negativos são fruto da “Ruptura em Loja”, conceito conhecido no varejo e utilizado quando um produto comercializado pelo varejista não é encontrado no ponto de venda pelo cliente.
Sob a ótica do cliente a ruptura em loja é negativa porque pode, no limite, fazer com que ele abandone a marca devido a má experiência de compra. Em tempos de era digital e redes sociais, o impacto previsto por Phillip Kotler de que um cliente insatisfeito conta sua experiência negativa para 11 pessoas ganhou outra dimensão. A perda da venda de um único produto por ruptura pode ser projetada para a perda da venda de uma cesta de produtos, que, por conseguinte, para a perda de um cliente e eventualmente para a perda da rede de contatos desse cliente.
Com relação à gestão de fluxo de caixa, a ruptura é prejudicial porque reduz potencialmente a margem de venda do varejista e a realização do caixa no prazo planejado. Se entendermos que a ruptura impacta negativamente na venda de um produto em seu ponto ótimo, melhor mark-up (preço de venda – preço de compra) e melhor relação dias de estoque versus prazo de pagamento, ela inevitavelmente gera a sua comercialização em momento onde essas duas relações não são ótimas. A título de exemplo, pense em um item para o Dia das Crianças; se não exposto no momento correto ele perde seu principal apelo de venda (Dia das Crianças) e para ser comercializado depois deverá oferecer ao cliente outro atrativo, como redução de preço, o que acaba reduzindo a margem de venda do varejista e comprometendo a relação planejada de prazo de pagamento e prazo de venda.
Um erro comum dos executivos do varejo é entender que as causas da ruptura estão apenas na operação do ponto de venda (gestão de estoque, reposição, exposição e atendimento), mas para que o produto chegue até ele diversos processos são movimentados. São também nas falhas de estratégia e execução desses processos que podem estar a causa-raiz da ruptura.
Dois macroprocessos que antecedem a operação de loja são determinantes para que um produto seja entregue no ponto de venda: abastecimento e logística. O primeiro estabelece para quem, o que e em que volume devem ser distribuídos e repostos os produtos adquiridos para revenda; o segundo operacionaliza essa estratégia do fornecedor e/ou dos centros logísticos para os pontos de venda.
No macroprocesso de abastecimento falhas no dimensionamento e no entendimento do perfil da demanda dos pontos de venda, bem como na regra de reposição dos estoques, podem deixar, entre outras falhas, a definição de envio de produtos (sortimento) e volumes (profundidade) incondizentes com a demanda e calendário de eventos comerciais, o que favorece a ruptura em loja.
Mesmo quando a estratégia de abastecimento é realizada de forma adequada, o risco de ruptura se mantem devido a enormidade de processos logísticos que devem ocorrer sem desvio de performance para entregar o volume e o produto planejado no ponto de venda. Cadastro, conferência (SKU, volume, dimensões e fator de conversão) dos produtos recebidos, incorporação no estoque sistêmico, manuseio, armazenagem, separação, emissão de NF, expedição para o ponto de venda, baixa de produtos avariados e/ou desviados e inventários, são alguns dos exemplos de processos logísticos que podem interferir na execução da estratégia de abastecimento.
Esse emaranhado de processos tem grande interdependência, falhas ocorridas no início do processo carregam e aumentam seus efeitos negativos ao longo da cadeia de valor, daí a necessidade de manter forte gestão sobre os processos envolvidos.
Essa gestão robusta só é possível quando o varejista alinha processos padronizados, indicadores de performance (KPIs) e gestão da rotina. Ou seja:
1) quando os processos são conhecidos e desempenhados de forma padronizada independentemente de onde e por quem ele é executado;
2) quando são conhecidos os pontos de fragilidade do processo e criados indicadores para monitora-los na frequência suficiente para o desenho soluções de correção e;
3) quando o time é sensibilizado pela performance dos indicadores e busca superar as metas estabelecidas, discutindo soluções nos eventos periódicos realizados nos diferentes níveis de tomada de decisão do varejista.
Embora simples, essa abordagem pressupõe profundo conhecimento dos processos e visão holística de causa e efeito de cada um deles sob a ótica de processos, sistemas e organização. Um olhar externo e provocativo pode dar luz e relevância a oportunidades eventualmente não identificadas ou não priorizadas pelo time do varejista, cada vez mais ocupado com as rotinas operacionais do dia a dia.
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