Foi-se o tempo em que o pãozinho francês reinava absoluto nas mesas (e padarias) brasileiras. A vez agora é do pão artesanal! Crocante por fora, mais denso por dentro e supersaboroso, vem resgatando a tradição do modo caseiro de preparar a massa e conquistando até os corações, ou melhor, os paladares, mais distintos.
Original do início ao fim da receita, o pão artesanal diferencia-se do industrial – produzido em larga escala – principalmente pela presença do chamado fermento natural, que pode ser fabricado pelo próprio “padeiro” e produz sabor único e incomparável em cada exemplar que sai do forno.
O chef boulanger (especialista em pães) José Gomes, professor no curso de gastronomia das Faculdades Promove, em Belo Horizonte, entrega os dois segredos de um artesanal perfeito: modo de preparo e qualidade do fermento. “Por causa disso, a chance de se ter um pão igual em países diferentes é impossível, já que as leveduras presentes em cada ambiente são diferentes também”.
Tendência
Para o especialista, consultor na padaria VIpp, em BH, a valorização do produto “caseiro” – cuja massa pode levar até 80 horas para fermentar – tem a ver com um movimento mundial de reconhecimento do que é feito visando mais à qualidade do que à quantidade. “Vivemos o momento da industrialização, em que era preciso dar conta da alta demanda. Agora, retomamos o processo artesanal. As pessoas estão mais dispostas a modificar a rotina, pois entendem que o produto é diferenciado”, afirma o chef.
Mais delicados e trabalhosos e, portanto, também mais caros, os pães artesanais são versáteis e combinam com quaisquer tipos de ingredientes. A qualidade, frisa o chef, tem mais a ver com o modo de “cuidar” do fermento do que com os outros ingredientes que vão junto na receita.
Para se ter uma ideia, o fermento mais antigo de que se tem notícia no mundo foi fabricado mais de 150 anos atrás e é usado até hoje. Uma tradicional padaria belo-horizontina também utiliza a mesma matéria-prima há mais de dez anos.
“Por se tratar de um alimento vivo, que depende das leveduras presentes no ar para fermentar, é preciso que seja diariamente cuidado e alimentado. Senão, morre”, enfatiza o chef boulanger.
Ao contrário dos pães industriais, que fermentam por cerca de seis horas, os artesanais precisam de, no mínimo, 20. Na lista de ingredientes, o principal deles (e fundamental!) é o fermento natural, que pode ser feito, por exemplo, com uma mistura de maçã (batida no liquidificador) e água. “O mosto originado é deixado em temperatura ambiente por dois dias, contamina-se, então, com as leveduras presentes no ar, que, por sua vez, metabolizam o açúcar da fruta”, detalha José Gomes
Depois de coada, a mistura precisa ser “alimentada” todos os dias com água e farinha para que se transforme em fermento. Para ser usada pela primeira vez precisa ser “cultivada” por dez dias. A partir daí, dura quanto tempo for tratada direitinho. “É como se fosse um filho mesmo. Tem que cuidar e tratar (acrescentar farinha e água). Se não alimentar, morre”, reforça o especialista em pães José Gomes.
Tanta mão de obra tem mais do que um resultado só. Além de mais saborosos, devido à ação do fermento natural, que tem gosto peculiar, pães artesanais têm casca mais grossa, miolo mais denso e sabor acentuado, que vai do ácido, caso dos italianos, mais “azedos”, ao lático. Por todas essas razões, diferentemente do pão francês, que muitas vezes derrete na boca, ele também sacia por mais tempo.
Para mantê-lo fresco, descarte o papel em que é vendido e mantenha-o em recipientes hermeticamente fechados. Isso evita a chamada retrogradação do amido ou perda de água para a superfície. A boa notícia é que o fermento natural retarda o processo de “envelhecimento”. “É possível comprar um pão artesanal na terça-feira e consumi-lo fresco até sexta”, reforça o chef.
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